2007/07/30

Modest Mouse

Pop Modesta?

Está de volta ao mundo da música, a banda dos títulos longos. E primeira sensação que temos, é um dejá-vu imediato e instantâneo, aquela percepção estranha de já ter ouvido vezes sem conta estes acordes, apesar de termos a certeza absoluta que só agora estamos perante o primeiro contacto com We Were Dead Before The Ship Even Sank.
Agora que decorrem cerca de 3 anos, da sua obra-prima Good News for People Who Love Bad News, surge uma obra a transbordar de pop/rock, todo ele perfeito e onde a principal arma de guerra é a voz de Isaac Brock. É este o cartão-de-visita dos Modest Mouse, voz anazalada e quase sempre em revolta, em constante sofrimento, todo resto são lugares comuns pop. A criação de tudo isto surge com uma perfeição cósmica, com ondas pré-definidas, onde tudo parece ter sido bem pensado e previsto ao milímetro, é só carregar em botões e aguardar o rodar da fita magnética.
O moderno pop/rock é assim, feito de lugares comuns, recorrendo a normas e efeitos já há muito testados e comprovados, o que faz toda a diferença é o toque especial de cada banda, e os Modest Mouse tem essa capacidade, esse dom. Aliando à sua enorme capacidade de criação de canções, cheias de humor e sarcasmo, Isaac Brock e os restantes Modest Mouse, convidaram dois artistas de peso Johnny Marr (ex-Smiths) e James Mercer (The Shins), o primeiro emprestando os seus dotes como guitarrista e o segundo fazendo backing-vocals em temas com “We've Got Everything” ou “Florida”.
Para os conhecedores de toda a obra dos Modest Mouse, este álbum distingue-se dos outros em virtude de existir muito mais harmonia e mais melodia do que é habitual, não estamos perante um disco perfeito, mas é um disco muito bem disposto e com uma capacidade de transmitir essa sensação ao seu ouvinte… deixando um perfume de bem-estar no ar, perfeito para o por de sol na praia.

Momento Mágico
: Florida


Modest Mouse – “We Were Dead Before The Ship Even Sank” (2007) - Sony

2007/07/25

Bodi Bill

Extraordinariamente Meigo

Desde os seus primórdios, algures nos anos 70 com o disco/funk e com parcos meios electrónicos disponíveis, que a electrónica assumiu a sua identidade, trazendo até ás pistas de dança novos sons e subgéneros sem fim. Trinta e tal anos volvidos, nem toda a electrónica é hoje para dançar, resultando, da fusão estilística com outros géneros, musica para ambientes mais ascéticos. No More Wars, álbum de estreia dos alemães Bodi Bill, vive na electrónica mas viaja por todos os quadrantes musicais. Recorrendo a instrumentos clássicos – piano, violino e guitarra – combinados com genuína composição computorizada, são impressas, em texturas digitais, melodias naturalmente orgânicas.
As secções repetitivas e uma e concisa estrutura, focam os elementos acústicos, conferindo assim um certo cariz pop à música. A forte presença do songwriter, quer na letra quer na parte vocal, traz para alguns dos temas mais introspectivos - "Traffic Jam" e "Very Small"– um condimento folk. O segundo e terceiro terços do disco são entusiasticamente dançáveis, com temas techno, trance e electro – "Kilogramm", "Be Home Before" "Dinner", "Naegel".
Não é um disco puro-sangue, muito pelo contrário, tanto nos atira para ritmos dinâmicos como nos mima com apaixonadas baladas – "Willem". Por isto, No More Wars é música digital extraordinariamente meiga.

Momento Mágico: Kilogramm


Bodi Bill
- No More Wars (2007) - Sinnbus

2007/07/21

Dragonette

Estreia Auspiciosa

O disco de estreia desta banda canadiana, sedeada em Londres, que se assume como “uma banda rock-electrónica que escreve canções pop…”, confirma as boas indicações deixadas pelo EP homónimo, lançado em 2005, e constitui uma lufada de ar fresco no panorama actual da música pop.
Os Dragonette praticam uma electro-pop moderna, que apela às pistas de dança, resultado da fusão da pop e synth-rock, característica de bandas dos anos 80, com as mais recentes tendências, que reveste uma elevada dose de provocação e possuem uma vocalista/frontwoman Martina Sorbara que, para além dos seus inegáveis dotes vocais que lhe valeram um convite para colaborar no disco novo dos Basement Jaxx, é carismática, provocante em palco e, porque não dizê-lo, muito dotada fisicamente.
Galore agrega temas presentes no seu EP de estreia, como "I Get Around", "Competition" e "Jesus Doesn’t Love Me", a temas novos, nomeadamente, "Another Day", "Get Lucky, Black Limousine, Gold Rush" e "Marvellous" e ainda outros resultantes da reformulação de algumas das suas primeiras composições, como a faixa "True Believer".
Temas recorrentes nas suas canções são as mensagens de grande carga sexual, celebrando um mundo de promiscuidade sem remorsos e de predadores(as) sexuais, designadamente em faixas como "I Get Around, True Believer" e "Competition" e o comportamento em palco da vocalista, autora de frases emblemáticas como “Who do I have to fuck to get you to dance?”, granjeou-lhes algum destaque entre a comunidade musical, bem como ferozes ataques por parte de algumas comunidades religiosas mais conservadoras.
Os Dragonette encontram-se na antecâmara do sucesso, escrevem belas canções pop, são provocantes e polémicos q.b., existe um grande hype à sua volta, têm por isso tudo para dar o salto definitivo do universo “indie” para o mainstream. O tempo dirá se vão ser bem sucedidos.

Momento Mágico: I Get Around


Dragonette - Galore (2007) - Universal

2007/07/18

Bill Callahan

Com Alma

A voz é um aroma, não interessa agora (ou noutra altura) auferir a sua qualidade, se é cristalina, angulada, negra, rouca ou de qualquer outra cor, forma ou tamanho, o que importa é afirma-lo como ponto de contacto, como lembrete instantâneo e poder dizer: “olha isto é….”. E isto é Bill Callahan.
Este anterior momento de prosa, nasce após a audição do último trabalho do Sr. Smog. Woke On A Whaleheart, um disco repleto de alma, onde a luz se cruza com a sombra, uma espécie de eclipse total do sol, mas com uma duração superior ao normal. Bill Callahan é um songwriter por excelência, onde temas com o sexo, a paixão, o amor, a natureza circundante, são explorados de uma forma intensa e com uma beleza fora do comum, mas sem nunca sair do imensamente banal. Musicalmente a forma como disco está construído, abandonando quase por completo a linhagem eléctrica e criando um corpo suportado em sons de órgão e bateria despreocupada, dando-lhe uma visão gospel-country.
Woke On A Whaleheart não é mais do que um paraíso construído à imagem de Cash “The Wheel” ou de Cohen “Diamond Dancer”, ”A Man Needs A Woman Or A Man To Be A Man” é pura e directa, uma canção densa e ampla.
O primeiro trabalho em nome individual de Bill Callahan, é um disco atestado de emoções, sentimentos e energéticas ondas de paixão, deixando os simpatizantes de Smog baralhados, pois o resultado final é soberbo, sendo que Woke On A Whaleheart é um dos grandes trabalhos de 2007.
Bill Callahan é um senhor a seguir com imensa atenção, prevejo uma continuidade da obra, mas com cada vez mais sensibilidade e maior simplicidade.

Momento Mágico
: Diamond Dancer


Bill Callahan
- Woke On A Whaleheart (2007) – Drag City


2007/07/15

Blonde Redhead

Flutuar Em Mistério

Por vezes, inexplicavelmente, há discos que se apoderam de nós, sem que possamos fazer algo contra esse facto. Por mais que os ouçamos, tarda a hora em que é posto de lado e tempo de partir para outro. 23 dos Blonde Redhead é um desses casos. Por isso a melhor forma de me libertar de 23 é, como diz um amigo meu, escrever. Não se trata apenas de mais um álbum na linha do indie rock ou pop, digamos que aqui há muito de experimental, de criação temerária, desafiando deste modo as classificações convencionais.
Desde o primeiro momento, com o tema homónimo, o disco indicia uma elevada densidade marcada sobretudo pela liderança da guitarra e por uma firme bateria. Mas é a voz de Kazu Makino, que nos alicia a entrar num ambiente volátil, intenso, eléctrico, mas indulgente. Um teatro onírico de cenas emotivas. Depois é somente flutuar pela estratosfera polifónica, composta por delicados ritmos electrónicos, melodias doces e vozes apaixonadas.
Misterioso e de uma estranha beleza, 23 revela-se mais como uma forma audaciosa de arte/pop, em que poucas bandas actualmente em cena ousariam arriscar. Tal ousadia é a marca que distingue uma banda com 14 anos de carreira e sete discos lançados. E este é sem dúvida um testamento ao talento e à reinvenção.

Momento Mágico: Dr. Strangluv


Blonde Redhead - 23 (2007) - 4AD

2007/07/04

Meio Ano - Meia Lista

ATENÇÃO: O exercício que se segue, é de grande dificuldade e não deve ser tentado em casa...

Fazer uma lista de qualquer coisa relacionado com musica, é sempre uma coisa que vejo como uma brincadeira (até porque amanhã a lista seria diferente) e foi com esse espírito que pedi aos meus colaboradores uma pequena listagem dos melhores discos de 2007 à presente data. Mais uma vez a minha única intenção, é divulgar...
Cada um de nós, seleccionou 5 temas, ao qual corresponde uma pequena compilação - VER AQUI

António Antunes

Electrelane - "No Shouts, No Calls"
Quando as gajas se transformam em mulheres.


Of Montreal - "Hissing Fauna, Are You The Destroyer"
Pop lunatico, recheado de trejeitos e lantejoulas.


Panda Bear
- "Person Pitch"
Quando meio, consegue ser tão bom quanto o todo.


Odawas
- "Raven And The White Night"
A escuridão rock repleta de luminosidade sonora.


No Age - "Weirdo Rippers"
O encaixe perfeito entre velocidade sónica e calmaria desafinada.


Bruno Coelho

Grails - "Burning Off Impurities"
Um Acid Folk que nos leva numa viagem ao passado. Uma viagem que por vezes é bastante atribulada.


LCD Soundsystem
- "Sound Of Silver"
Indo por caminhos mais rock conseguiram continuar a inovar. Passaram com distinção no teste do 2º álbum.


Electrelane
- "No Shouts, No Calls"
O som é o mesmo, a garra é a mesma...
É difícil destacar o melhor álbum delas, mas este é um forte candidato.


Parts & Labor
- "Mapmaker"
O som está mais limpo do que nos têm habituado, mas a energia continua lá.
Mais um que passa com distinção no teste do 2º álbum.


Modest Mouse
- "We Were Dead Before The Ship Even Sank"
Good news for people who love good music.
A energia pop em todo o seu esplendor.


Carlos S. Silva

Aqualung – "Memory Man"
Matt Hales incorporou novos elementos na concepção deste disco e atinge um patamar muito elevado. Sentimentos à flor da pele num artista promissor em constante crescimento. Correndo por fora, este continua a ser um dos meus discos preferidos de 2007.



Arcade Fire
– "Neon Bible"
O disco de estreia dos Arcade Fire foi um marco discográfico do ano de 2004. Honrar esse legado não era uma tarefa fácil, mas os Arcade Fire conseguiram-no e superam o obstáculo com um disco que roça a genialidade e lança novos horizontes sobre o futuro da banda.


Au Revoir Simone –
"The Bird Of Music"
Dizem que a verdadeira beleza reside na simplicidade das coisas, o disco de estreia deste trio nova-iorquino ilustra na perfeição essa máxima. È impossível ficar indiferente à delicadeza, à harmonia e à musicalidade que irradiam deste disco.



The Shins –
"Wincing The Night Away"
A banda de Albuquerque continua a subir a fasquia a cada edição discográfica. Este disco é um compêndio de grandes canções, um verdadeiro manual do rock. Muito embora o ano ainda vá a meio, este disco vai constar, sem qualquer dúvida, na lista dos melhores do ano. Imprescindível.



Wray Gunn –
"Shangri-La"
A banda de Coimbra, com um disco repleto de canções que se entranham à primeira audição, ingressa com todo o mérito nesta lista. Rock old school em pleno processo de maturação e que poderá levar os Wray Gunn a voos mais altos no panorama musical internacional.


Edgar Domingues

Blackfield – "Blackfield II"
Sonoridade épica em moldura pop-rock. Soberbo.


Blonde Redhead
– "23"
23 é o atingir da idade maior, ousar o eclético emocional mas com maturidade.


Bodi Bill
– "No More Wars"
Acabaram-se os padrões, habita na electrónica mas viaja por todos os quadrantes musicais.



Voxtrot
– "Voxtrot"
Pop menos mainstream para adolescentes tardios. Quero voltar a ser um puto.


Electrelane
– "No Shouts No Calls"
Um disco de se lhe tirar o chapéu.

2007/07/01

Ray LaMontagne

Country Bluesman

Existem muitos artistas no mundo, uns conseguem aliar a composição musical à transmissão de sentimentos e emoções, outros não. Ray LaMontagne integra-se, claramente, no primeiro grupo, quero dizer com isto que a sua música é, acima de tudo, sentida e depois cantada. O modo apaixonado como canta, as letras introspectivas e a capacidade que tem para as exprimir musicalmente deixa poucas dúvidas sobre o seu talento.
Em "Be Here Now", faixa de abertura do disco, Ray LaMontagne demonstra a evolução do seu som, desde o disco de estreia Trouble, guitarra acústica dedilhada, piano longínquo, secção de cordas que confere um ambiente etéreo, perturbador e acima de tudo uma vocalização agreste, profunda e verdadeira.
Outra das grandes canções do disco é “Lesson Learned” é uma canção amarga, sobre um relacionamento em que alguém parece não perceber, ou querer aceitar, que já não é desejado. Em “You Can Bring Me Flowers”, outra canção amarga, vigora um riff de baixo que, juntamente com uma secção de metais inspirada em Miles Davis, transforma, de forma muito positiva, o som habitualmente simples e directo de Ray LaMontagne.
A faixa que dá nome ao disco é uma reflexão sobre uma sociedade austera, feita com uma tristeza profunda, que se sente como um murro no estômago e que nos faz reflectir sobre o modo como vivemos a vida e encaramos o próximo.
Till The Sun Turns Black é um disco genuíno, distante da superficialidade de muitos artistas dos nossos dias, que pinta um quadro de uma realidade triste, de uma sociedade decadente e sombria e não deixa ninguém indiferente.
Imprescindível.

Momento Mágico: Be Here Now


Ray LaMontagne Till the Sun Turns Black (2007) - RCA